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Uso de novas substâncias psicoativas

Não há dúvida quanto às melhorias que o progresso tecnológico pode proporcionar às nossas vidas, incluindo os benefícios atrelados às pesquisas que desenvolvem novas medicações. Infelizmente, as descobertas também são utilizadas para a criação de drogas que causam dependência, como as novas substâncias psicoativas.

Nesse cenário, a luta de familiares e médicos para combater a dependência química causada por esses entorpecentes se torna ainda mais desafiadora do que já é de costume.

Você sabe quais são essas substâncias, como se dá o uso de novas drogas, como elas são produzidas e, principalmente, quais efeitos elas proporcionam ao organismo? Confira todos esses detalhes a seguir com o psicólogo Antônio Chaves Filho!

O que são as novas substâncias psicoativas (NSP)?

Igualmente conhecidas pela sigla NPS (do inglês, New Psychoactive Substances), as NSP (novas substâncias psicoativas) são caracterizadas pela realização de experimentos que objetivam combinar elementos químicos introduzidos nas fórmulas de outras drogas.

Um dos primeiros pontos que chamam a atenção é que as fontes de substâncias utilizadas no desenvolvimento das NSP são tanto legais quanto ilegais. O intuito é mesclar moléculas e proporcionar efeitos semelhantes aos de drogas conhecidas, como a LSD e a cocaína.

Evidentemente, tanto a produção quanto a distribuição e comercialização desse tipo de produto são proibidas pela legislação de vários países. Contudo, a identificação, a detenção e a prisão das pessoas envolvidas são processos um tanto complicados.

Longe de ser um problema novo, a dificuldade é semelhante à que se vê durante o monitoramento de diferentes redes de tráfico de drogas. Além disso, novas drogas são sintetizadas a todo o momento, como é o caso da cocaína rosa.

Os esforços no combate às NSP são muitos, uma vez que essas substâncias já se espalharam por cerca de 130 países ao redor do mundo. Cada um desses territórios admite haver detectado pelo menos uma NSP em circulação.

Para termos uma ideia da agilidade do desenvolvimento de alternativas diferenciadas no mercado, basta considerar o intervalo entre os anos de 2009 e 2021. Somente ao longo desse período já foram detectadas mais de 1.120 substâncias pertencentes ao referido grupo. Em média, isso equivale a mais de uma NSP inédita a cada 7 dias.

Quais são os efeitos provocados pelas NSP?

Conforme o tipo de NSP, ela é capaz tanto de deprimir quanto de estimular excessivamente o sistema nervoso central (SNC). Além disso, o consumo contínuo desse tipo de droga tende a levar à toxicodependência. O fenômeno, que também exibe uma ligação estreita com outras drogas, pode levar a estas consequências:

  • síndrome de abstinência;
  • dependência física e psíquica;
  • tolerância aos componentes da fórmula.

Mais adiante, listamos algumas informações relacionadas aos riscos atrelados a cada NSP, abordaremos os detalhes mais abaixo — quando falamos sobre os típicos efeitos de cada uma delas. Além disso, também explicaremos o que cada uma dessas síndromes representa e quais os perigos delas.

Qual o contexto de surgimento das NSP?

Para entendermos quais os efeitos práticos do surgimento das NSP, precisamos responder a uma pergunta central sobre elas: afinal, por que surgem novas drogas e qual a principal diferença entre elas e as já existentes?

Para entendermos o panorama atual do uso de drogas no Brasil, é fundamental analisarmos os dados sobre ele. De acordo com relatórios do Ministério da Saúde, tivemos um crescimento de cerca de 50% nos atendimentos de usuários de drogas no Brasil em 2020.

Esse fenômeno é parcialmente explicado pela pandemia, e acompanha tendências anteriores em momentos de crise: como regra, nesses momentos, há uma propensão maior ao uso de drogas, que agem como um “tamponamento” dos sentimentos negativos das pessoas.

No entanto, a pandemia não é o único explicativo no aumento súbito do uso de drogas no Brasil. De acordo com uma pesquisa realizada pela Fiocruz em 2019, cerca de 11% dos brasileiros fazem ou já fizeram uso de substâncias ilícitas durante a vida. O elevado número nos leva a entender que o abuso de drogas já é um problema em nossa sociedade.

No mesmo estudo, observamos que a principal droga ilícita utilizada é a maconha, já experimentada por 7% dos entrevistados. Embora ainda seja um número alto, ele pouco se compara ao uso de álcool e tabaco, que já foram experimentados, cada, por um terço da população.

Existe algo em comum entre essas 3 drogas: elas são relativamente baratas se comparadas às outras e são derivadas de produtos naturais, como a cana-de-açúcar e o tabaco. Essas características fazem com que essas drogas sejam muito antigas, com relatos de seu uso há milênios.

No entanto, a mesma característica que popularizou essas drogas também impõe a elas um teto de produção. Por serem derivados de produtos naturais, sua produção depende de variáveis pouco controladas, como variações do clima, infestação por parasitas e espaço geográfico.

Essas características (pouco favoráveis ao negócio no século XXI) são consideradas um marco para a mudança em direção às drogas sintéticas. Ao contrário das drogas derivadas de produtos naturais, as NSP podem ser produzidas em pequenos espaços, com pouca variação em relação ao clima e às estações do ano.

Além disso, por serem majoritariamente produtos sintéticos, elas são no geral muito mais fortes — ou seja, provocam alterações no cérebro que dificilmente seriam atingidas com as drogas mais antigas.

Como essas substâncias são desenvolvidas?

Como qualquer outro produto ilegal, esses psicoativos com formulação alterada são fabricados em laboratórios clandestinos. De maneira bem resumida e objetiva, os fabricantes de NSP alteram a estrutura química dos produtos previamente selecionados.

Além de outras drogas ilícitas, como comentamos, o uso de medicamentos de consumo controlado é igualmente frequente. Em termos específicos, as piperazinas, as catinonas e os canabinoides são as substâncias mais comuns. Também é recorrente a inserção de elementos provenientes da mescalina e da anfetamina.

O desenvolvimento descontrolado dos NSP também é alvo de preocupações. Como essas drogas tendem a ser mais potentes do que as outras, pequenas modificações de dose podem gerar efeitos catastróficos. Por isso, sua produção em laboratórios clandestinos traz ainda mais perigo aos usuários.

Além disso, não é uma prática incomum que os fabricantes mesclem diferentes drogas para mascarar o efeito das drogas — e, assim, dar ao usuário a impressão de que uma droga é mais forte do que é, por exemplo. Essas substâncias “misturadas” às drogas podem inclusive ser medicamentos, que em alguns casos são proscritos a determinados pacientes e podem trazer ainda mais danos à saúde.

Quais as principais preocupações em relação às NSP?

Como já mencionamos, as NSP têm como uma de suas características centrais o fato de conseguirem provocar alterações cerebrais mais intensas. A curto prazo, isso contribui para que elas tenham um efeito mais forte sobre os usuários — porém, a médio e longo prazo, isso também gera efeitos mais nocivos à saúde.

De modo geral, conseguimos separar esses efeitos entre as síndromes de tolerância e abstinência. A tolerância ocorre quando o corpo compreende que a dose à qual está exposto da droga está excessiva; isso causa uma “adaptação”, de modo que uma pequena dose não será mais suficiente para gerar os efeitos que antes conseguia causar.

A tolerância ocorre principalmente por um mecanismo chamado de “internalização de receptores”. Podemos explicá-lo da seguinte maneira: quando o cérebro está exposto a uma droga, ele libera vários neurotransmissores (como a dopamina, considerada responsável pelo prazer).

Quando esses neurotransmissores estão excessivos no cérebro, ele percebe e tenta contrabalancear. Isso é feito retirando os receptores do neurotransmissor, que são as estruturas responsáveis por reconhecê-lo e transformá-lo em efeitos psicológicos. Esse é o principal mecanismo da internalização de receptores.

Durante o período de tolerância, portanto, ocorre uma redução do efeito causado pela droga. Isso faz com que o usuário aumente a dose para conseguir o mesmo efeito, o que gera uma internalização ainda mais profunda. Esse círculo vicioso, em última análise, causa um comportamento de busca incessante pela droga.

A abstinência geralmente ocorre quando o usuário já está em estado de tolerância, embora isso não seja uma regra. Como o nome sugere, essa síndrome é caracterizada pela interrupção súbita do uso da droga.

Para entender a abstinência, vamos recordar do mecanismo de internalização: se uma pessoa faz uso de uma droga por longos períodos, seu cérebro possui poucos receptores para os neurotransmissores estimulados por aquela droga. Quando ele interrompe subitamente o uso, aqueles receptores (que estavam acostumados a altas doses de neurotransmissores) ficam subitamente desestimulados.

Isso causa, na prática, efeitos opostos ao do efeito da droga. Substâncias ativadoras (como, por exemplo, a cocaína) atuam junto a síndromes de abstinência caracterizados por inibição do sistema nervoso. Sintomas como sonolência, redução na pressão arterial e depressão podem ser vistos.

Por outro lado, substâncias depressoras, como o álcool e a heroína, cursam com uma abstinência ativadora. Esses pacientes podem sentir sintomas como tremores, aceleração dos batimentos do coração e até convulsões.

Quando falamos em NSP, que tendem a ter um efeito mais intenso, os sintomas de abstinência são ainda mais fortes. Por isso, usuários dessas drogas podem sofrer com abstinência mais cedo (sem precisar do uso crônico da droga) e até mesmo apresentar sintomas fatais. O período de desintoxicação também tende a necessitar de tratamento especializado.

Quais são as NSP mais consumidas no Brasil e seus principais efeitos?

Como explicamos, o raciocínio por trás das NSP é a oferta de variedades de drogas populares. Ao mesmo tempo em que conquistam mais usuários pelo apelo da novidade, as pessoas envolvidas nessa rede de tráfico conseguem criar versões que dificultam a identificação por parte dos policiais.

Dito isso, as NSP mais comuns são justamente espécies de cópias de algumas drogas muito conhecidas, portanto, com alta demanda no mercado. Vamos a alguns exemplos.

Canabinoides sintéticos

A ideia, aqui, é chegar o mais próximo possível do efeito gerado pelo THC (tetrahidrocarbinol), famoso princípio ativo da maconha. Basicamente, esse é o componente responsável pela sensação alucinógena comumente associada ao uso dessa planta.

Uma vez no organismo, a ação é a mesma da vertente original da droga. Isso significa que os canabinoides sintéticos também dependem dos receptores de THC. Vale destacar que ainda são necessários muitos estudos para compreender completamente o mecanismo de atuação desse fármaco.

Catinonas

Com efeito muito parecido ao provocado pelas anfetaminas, as catinonas consistem em um tipo de alcaloide. Dentro do corpo humano, elas iniciam um intenso processo de intercepção do trabalho dos receptores de serotonina e dopamina, totalmente associadas às sensações de prazer manifestadas pelo cérebro.

Não à toa, esse é o comportamento característico da cocaína. Sensação exagerada de euforia e aumento desmedido do sistema de alerta a perigos (mesmo inexistentes) são duas consequências frequentes entre os usuários.

Outros sintomas similares aos causados pela cocaína são a vontade incontrolável de falar, acompanhada ou não da elevação da libido. Por sinal, isso ajuda a explicar o fato das catinonas serem drogas sintéticas usadas durante a prática do Chemsex.

No caso, Chemsex se refere à utilização de alguma droga (metanfetamina, ecstasy, LSD, poppers etc.) com o objetivo de prolongar ou acentuar a sensação de prazer proporcionada pela atividade sexual. Seu nome advém do sufixo “Chem” (diminutivo para Chemical, que significa, em tradução literal, “Químico”) e “Sex” (do inglês, literalmente “Sexo”).

Feniletilaminas

Outras drogas produzidas em laboratório e pertencentes ao conjunto de NSP são as feniletilaminas. Elas são vendidas como substitutas do LSD. Versáteis, esse é um tipo de droga que aparece sob a forma de pó, líquido ou, ainda, como se fosse um comprimido comum.

Ao interagirem com determinados receptores, as feniletilaminas dão início ao poderoso efeito alucinógeno do LSD. No corpo, nota-se a aceleração dos batimentos cardíacos, hipertensão e calor. Na mente, confusão, além de episódios de delírios e alucinações — que costumam ser frequentes.

Assim como acontece com as versões “originais” dessas drogas, o risco de dependência é alto. A boa notícia é que os tratamentos eficazes para combater outras dependências também são adotados com sucesso no caso do consumo contínuo e prolongado de NSP.

Nesse sentido, vale enfatizar que os cuidados relacionados à recuperação do equilíbrio psíquico são fundamentais para que a pessoa afetada consiga voltar a conviver em sociedade. Os dependentes químicos das novas substâncias psicoativas são propensos a desenvolver quadros graves relacionados a distúrbios mentais.

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