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Como se preparar para a recuperação de dependente químico na família?

dependência química é um quadro grave que demanda um tratamento intensivo. Ela resulta da interação de diferentes aspectos da vida do paciente e há uma variação na quantidade de drogas para alcançar o efeito desejado.

De todo modo, é importante destacar que esse acometimento não nasce com a pessoa, sendo adquirido em vivências e por algum nível de sofrimento. A recuperação de dependente químico pode demandar uma internação, mas deve considerar juntamente o trabalho em família a ser realizado após o retorno do paciente ao lar.

Com a volta, familiares enfrentam angústias e ansiedade com temor de que todas as dificuldades que a dependência de substâncias psicoativas (SPAs) traz, se repitam. Por isso, o artigo que contou com a colaboração do psicólogo do Hospital Santa Mônica, Antônio Chaves Filho, aborda esse momento tão delicado. Leia e saiba mais!

Vamos conversar sobre os desafios na recuperação de dependente químico?

No quadro de dependência química, o paciente pode passar por um período de internação, que é importante para a desintoxicação e o afastamento de potenciais contingências que estimulam o uso da droga. O tempo necessário nesse processo varia conforme a interação de diferentes variáveis da vida do paciente.

Quando o dependente químico vai voltar para casa, a família enfrenta uma angústia. Alguns membros não querem o retorno, outros ficam inseguros, e todos temem recaídas. O paciente, por outro lado, pode ter uma visão distorcida da realidade, além de sofrer preconceitos ou desejar restaurar vínculos que podem ser desencadeadores de problemas.

Nesse ponto, a empatia é um ingrediente essencial. Ela não significa somente se colocar no lugar do outro, mas também sentir como o outro, com a ótica e a singularidade dele. Isso vale para a pessoa com dependência química e para a família. A boa notícia é que com apoio profissional e algumas iniciativas, é possível superar essa contingência.

Qual o papel da socialização no tratamento da dependência química?

Temos uma ideia relativamente ultrapassada de que a dependência química é uma escolha individual; afinal, é o próprio usuário que opta por iniciar o uso de drogas e mantê-lo, certo? Não necessariamente.

Recentemente, o problema com o uso de drogas no mundo levantou várias hipóteses de como conseguiríamos lidar com o tema. Um dos estudos mais impactantes sobre o tema avaliou a prevalência do uso de heroína em veteranos enviados à guerra no Vietnam.

Durante a guerra, os soldados americanos sofriam com uma onda considerável de uso de heroína. Muitas vezes vivendo em condições insalubres e longe da família, eles pareciam ver na droga o único refúgio em meio a um ambiente cada vez mais hostil.

Nos Estados Unidos, muito se pensava sobre as consequências desse cenário após a guerra: como seria lidar com um grande número de veteranos com dependência de uso de substâncias? O que poderia ser feito para amenizar os efeitos nocivos do abuso de heroína?

A resposta surpreendeu muitos cientistas. O que ocorreu, quando esses soldados retornaram para seus lares, foi que muitos deles pararam de fazer uso da heroína e viveram suas vidas normalmente.

A explicação mais plausível para esse fenômeno reside no fato de que a droga estava sendo usada como um mecanismo para tamponar a falta de socialização e a distância da família. Quando os usuários retornavam para seus lares, a dor da separação deixava de existir — e, consequentemente, foi possível se libertar da dependência com mais facilidade.

Trazendo esse estudo para os dias atuais, conseguimos compreender a importância do acolhimento e da socialização na recuperação de usuários de substâncias psicoativas. Embora os usuários contemporâneos não sejam, em sua maioria, veteranos de guerra, existem fatores psicossociais que podem estar impactando em sua dificuldade de recuperação. A ausência da família pode ser um desses fatores.

Por que o convívio familiar é importante?

Como vimos, o estudo dos veteranos vietnamitas focou especificamente no convívio familiar. No geral, consideramos que toda interação social é importante para o tratamento de usuários de drogas, mas a família ocupa um papel central.

Isso ocorre porque, em momentos de crise e turbulência, todos buscamos contar com um porto seguro e com pessoas confiáveis. Embora amigos e relações amorosas consigam suprir essa demanda, a família é, por definição, composta por relações estáveis que já acompanham o paciente desde sua infância.

Além disso, devido à longevidade dessas relações, a presença de familiares cumpre um papel único: o de evocar memórias agradáveis e ajudar o paciente a se lembrar de que a vida vale a pena sem o uso da substância.

Em casos de abuso crônico de drogas, não é incomum que o paciente informe que “não se lembra de como a vida é sem a substância”. Isso traz um sentimento de esvaziamento e de dependência, que muitas vezes não corresponde à realidade — afinal, a pessoa já teve um passado expressivo em que não precisou da droga para ter momentos felizes.

Isso ganha um impacto ainda maior quando verificamos que algumas drogas podem trazer distúrbios de memória, que podem ser difíceis de tratar. Na reabilitação, portanto, são utilizadas técnicas que busquem remeter o paciente ao passado. Nesse contexto, a presença de familiares toma uma importância ainda maior.

É importante recordar que amigos e relações amorosas podem inclusive ter sido feitas após o início do uso de drogas. Embora isso não retire o mérito da socialização e da importância de relações afetivas fora da família, este é outro fato que nos ajuda a entender a importância do convívio familiar.

É preciso mudar de cidade para ajudar na reabilitação?

Um dos grandes desafios que enfrentamos quando trazemos à tona a necessidade do convívio familiar no tratamento é saber a intensidade dessas intervenções. Em um primeiro momento, pode parecer desafiador carregar o “peso” do sucesso do tratamento. Por isso, precisamos desmistificar alguns conceitos sobre o tema.

Inicialmente, é preciso entender que a família é apenas um dos fatores envolvidos na reabilitação. Outros fatores que podemos citar são a capacidade para o trabalho, a existência de outras comorbidades psiquiátricas e o suporte de saúde oferecido.

Para que o tratamento seja eficaz, é ideal que esses fatores estejam equilibrados e sejam individualizados conforme a necessidade de cada paciente. Por exemplo, alguns conseguirão se tratar com consultas ambulatoriais, enquanto outros precisarão de internação.

Nos casos em que a família tem disponibilidade para se mudar com o paciente, essa seria uma opção a ser considerada — sempre, é claro, sob orientação médica e com um planejamento a longo prazo.

Nos casos em que a família não tem essa disponibilidade, é possível investir nos outros pilares do tratamento para contrabalancear. Uma das opções é investir em uma internação com equipe multidisciplinar, que conseguirá manter o suporte necessário para a recuperação do paciente.

Na internação, ainda é possível manter tanto o contato familiar quanto a socialização. É permitido visitas em momentos específicos e consultas conjuntas, sem necessitar da mudança de cidade por parte dos familiares.

Além disso, também é possível dividir a responsabilidade de visita e apoio entre vários membros da família, maximizando o suporte fornecido ao paciente. Uma das recomendações, por exemplo, é que os familiares se revezem nas visitas, para que cada um possa contribuir à sua própria maneira para a recuperação.

Como lidar com o retorno do dependente químico para casa?

Esse momento traz desafios, mas é também uma fonte de aprendizagem e de fortalecimento de laços. Veja algumas dicas sobre como lidar com a situação na sequência.

Entenda o nível de dependência

Entender o nível de dependência é importante para compreender a dificuldade que a pessoa enfrenta em relação ao desejo de consumo da substância psicoativa. Outro ponto relevante é o nível de resistência que a família enfrenta diante da necessidade de o paciente acessar a droga. Dessa forma, é possível criar estratégias para o diálogo e a negociação de resoluções para essa contingência.

Busque compreender o paciente

Não é incomum que o motivo do início do uso de drogas seja inespecífico. Nesses casos, um dos papéis importantes da família é buscar entender as razões do paciente e identificar possíveis pontos em que todos possam melhorar.

Um exemplo é a carência, que pode surgir por diversas razões. Caso ela seja identificada, um plano de ação é intensificar a presença da família para suprir essa necessidade e reduzir a relevância do uso da droga no cotidiano do paciente.

Estabeleça uma rotina 

A rotina é uma fonte de organização não só a nível prático, mas também mental. A pessoa com dependência química que retorna para casa está em busca de restabelecer uma ordem que foi perdida ou mesmo criar um equilíbrio.

Atividades cotidianas como estudos, trabalho e tarefas domésticas têm um grande poder de estabelecer um senso de propósito e trazer uma certa organização para o sujeito. Dessa forma, é possível gradualmente tornar a vida possível.

Crie rituais em família

Os rituais em família são experiências muito construtivas em que é possível fortalecer o diálogo e restaurar laços. Podem ser refeições em conjunto, passeios, filmes e até jogos, mas é necessário destacar que a participação deve ser espontânea. Isso não pode ser algo imposto, pois, nesse caso, geraria uma relação adversa ou um conflito.

Torne a família mais protetiva

Família protetiva é aquela que cria um espaço de aprendizado, orientação e acolhimento e proporciona condições para um desenvolvimento saudável e com qualidade de vida a todos os seus membros.

A proposta no momento do retorno do paciente com dependência química é de que a família proporcione conforto e limites. Isso envolve oferecer condições de empoderamento e encorajamento ao mesmo tempo em que cumprem seus papéis.

Nesse ponto, é necessário refletir sobre autoridade. Esse conceito envolve a delimitação de respeito entre filhos e as figuras materna e paterna. Há limites definidos, da mesma forma em que há espaço para o afeto. A proposta não é agressão física ou verbal, mas é preciso que as autoridades exerçam suas funções.

Tome cuidado com a codependência

família na dependência química pode apresentar algum nível de codependência emocional em um ou mais membros. Esse comportamento se caracteriza por uma obsessiva tendência de dedicação e cuidado ao paciente com dependência química, controlando as ações dele e deixando de cuidar de si mesmos.

Isso acontece principalmente quando há o sentimento de ser ética e moralmente responsável pela situação, o que não é verdade. Por isso, é importante que a família também se disponha a fazer um tratamento com profissionais qualificados.

Incentive o paciente a estabelecer novas amizades e vínculos

Algumas amizades, locais e vínculos podem ser potencialmente problemáticos no sentido de trazerem fatores que estimulam o retorno ao consumo de drogas. Uma boa abordagem nessa situação é ajudar o paciente com dependência química a fazer novos amigos e laços.

Jamais utilize um tom agressivo

Uma abordagem agressiva pode desencadear uma reação bastante adversa. A pessoa com dependência química pode adotar uma postura violenta e até partir para agressão física. Conforme mencionamos, é preciso estabelecer limites.

A questão é: de que forma esses limites são colocados? O exercício de autoridade pode ser feito de maneira respeitosa, com negociação e diálogo. A proposta é realmente apostar no sujeito. Quando você acredita no potencial de alguém, é possível produzir um efeito positivo.

Participe de grupos de apoio

Os grupos de apoio são uma excelente ferramenta para acolher familiares. Nessas atividades, é possível conversar sobre as dificuldades que todos estão passando, entender semelhanças, compreender pontos de vista e trocar experiências. Normalmente, o grupo é dirigido por um profissional especializado, que faz intervenções quando necessário. Dessa forma, é uma vivência rica em aprendizagem e crescimento. 

Quer saber como o Hospital Santa Mônica pode ajudar?

Nesse momento tão delicado, é muito importante que a família e a pessoa com dependência química tenham o apoio de profissionais. É recomendado que o paciente continue com a terapia e o tratamento medicamentoso.

Uma ótima opção são os grupos de apoio, como o Amor Exigente, que é uma iniciativa que tem promovido um trabalho muito construtivo na assistência a membros de famílias com usuários de substâncias psicoativas em acompanhamento profissional.

O Hospital Santa Mônica é uma instituição especializada para o tratamento de pessoas com problemas psiquiátricos ou dependência química. Contamos com uma ampla área de mata preservada e mais de 47 anos prestando serviços em saúde com compromisso, profissionalismo e priorizando o atendimento humanizado.

Nosso grupo de apoio para dependência química conta com profissionais especializados que auxiliam no fornecimento de acolhimento e promoção de reflexões. Dessa forma, contribuem para a recuperação de dependente químico e para o fortalecimento dos vínculos familiares.

A recuperação de dependente químico na família traz novos desafios para todos, não apenas para o paciente. A boa notícia é que, com suporte familiar e auxílio adequado, é possível sobrepor esses desafios e fornecer um apoio eficaz para a recuperação.

Você se identificou ou conhece alguém que precisa de ajuda especializada? Entre em contato com o Hospital Santa Mônica e conte conosco! Estamos preparados para explicar sobre as possibilidades de tratamento e te explicar mais sobre o assunto.

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