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Senado aprova projeto que restringe publicidade de apostas esportivas: um avanço na proteção da população vulnerável

O Senado Federal deu um passo decisivo nesta quarta-feira (28) ao aprovar o Projeto de Lei 2.985/2023, que impõe restrições rigorosas à publicidade das chamadas bets — apostas de quota fixa que movimentam bilhões no Brasil e têm gerado preocupações crescentes com seus impactos sociais. O texto, que agora segue para análise da Câmara dos Deputados, foi aprovado em plenário com apoio quase unânime de senadores da base do governo e da oposição.

O projeto, de autoria do senador Styvenson Valentim (PSDB-RN), propõe uma regulamentação equilibrada: não veta completamente a publicidade de apostas, mas impõe limites que visam conter o avanço dessa prática especialmente entre jovens e pessoas de baixa renda, que formam o grupo mais vulnerável ao vício em jogos.

Publicidade com rosto famoso? Agora é proibido

Uma das mudanças mais significativas é a proibição da participação de atletas, artistas, comunicadores, influenciadores e autoridades em campanhas de divulgação das bets. Apenas ex-atletas, com no mínimo cinco anos de aposentadoria da carreira profissional, poderão participar de ações publicitárias. A medida é uma resposta direta ao uso recorrente de celebridades em campanhas que vendem a ilusão de enriquecimento rápido por meio das apostas.

Essa “normalização” da prática do jogo, especialmente nas redes sociais e durante eventos esportivos, tem preocupado especialistas e parlamentares, que alertam para os riscos à saúde mental e financeira da população.

Uma questão de saúde pública

A motivação central dos autores e defensores do projeto é clara: combater o avanço da dependência em apostas, que já é tratado como uma questão de saúde pública no Brasil. Durante a votação, senadores destacaram o número crescente de pessoas com transtornos psicológicos, casos de suicídio e dívidas impagáveis associados ao uso compulsivo de plataformas de apostas.

“Tem pessoas se degradando, perdendo patrimônio, ficando doentes psicologicamente, sendo vítimas até de suicídio ou de agiotas. São pessoas que acreditam na mentira vendida por um influencer em uma propaganda”, alertou o senador Styvenson Valentim.

Dados do Instituto DataSenado revelam que 13% dos brasileiros com mais de 16 anos — cerca de 22 milhões de pessoas — fizeram apostas em bets nos 30 dias anteriores à pesquisa. O levantamento também apontou que a maioria desses apostadores (52%) recebe até dois salários mínimos, o que reforça o risco de endividamento e exclusão social desse público.

O que será proibido?

O texto aprovado impõe uma série de proibições à publicidade de apostas, entre elas:

  • Propagandas com rostos famosos ou pessoas ligadas ao esporte profissional;
  • Publicidade durante transmissões ao vivo de eventos esportivos;
  • Cotações e odds exibidas em tempo real fora dos sites oficiais das plataformas;
  • Conteúdos que associem apostas ao sucesso pessoal, riqueza, sexualidade ou solução financeira;
  • Propagandas dirigidas, direta ou indiretamente, ao público infantil e juvenil;
  • Patrocínios a árbitros e membros da arbitragem;
  • Qualquer forma de publicidade impressa ou impulsionada fora do horário permitido;
  • Peças publicitárias sem a obrigatória frase de alerta: “Apostas causam dependência e prejuízos a você e à sua família.”

O que será permitido?

Mesmo com as restrições, o projeto ainda permite a veiculação de publicidade em condições controladas, como:

  • Na TV, entre 19h30 e 24h; no rádio, das 9h às 11h e das 17h às 19h30;
  • Em redes sociais e streaming, somente para usuários comprovadamente maiores de 18 anos;
  • Antes e depois (15 minutos) da transmissão de eventos esportivos ao vivo;
  • Em canais próprios dos operadores ou patrocinados, com acesso voluntário;
  • Em chamadas de eventos entre 21h e 6h, sem incentivos ou promessas de ganhos.

Equilíbrio e responsabilidade

O relator do projeto, senador Carlos Portinho (PL-RJ), destacou que a proposta busca um caminho do meio, sem criminalizar uma atividade já regulamentada, mas impondo barreiras ao seu alastramento descontrolado. “Não é uma proibição total, mas sim uma regulamentação para proteger os mais vulneráveis”, afirmou.

Apesar das pressões de clubes de futebol e emissoras preocupadas com os impactos financeiros da proibição de publicidade em estádios, o relator buscou um equilíbrio. Exceções foram incluídas, como a possibilidade de divulgação quando o operador das bets for patrocinador oficial do evento ou do uniforme das equipes — desde que limitado a um anunciante por time.

Importância da aprovação

A aprovação do PL 2.985/2023 representa um avanço significativo na regulação de um mercado que cresceu desordenadamente e encontrou terreno fértil na crise econômica e na popularização das plataformas digitais. Mais do que controlar a publicidade, o projeto busca mitigar os impactos sociais da ludopatia — o vício em jogos de azar — que afeta milhões de brasileiros.

Ao frear o apelo sedutor e massivo das propagandas, especialmente as que prometem retorno financeiro fácil, o Brasil dá um passo importante para proteger sua população mais vulnerável. O desafio, agora, é garantir que o projeto seja aprovado também na Câmara dos Deputados e que a regulamentação seja efetiva, com fiscalização rigorosa.

Trata-se de uma medida que, além de responsabilidade política, representa um gesto de empatia social e prevenção em saúde pública.

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