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O que mais afeta o equilíbrio psíquico das mulheres?

As mulheres, assim como os homens, são afetadas pelas doenças mentais. Mas questões relacionadas ao gênero feminino as tornam mais vulneráveis. A boa notícia é que a prevenção é possível.

O fato é que, quando o assunto é a saúde mental das mulheres, a depressão é duas vezes mais comum quando comparada aos homens.

Segundo o psiquiatra Hewdy Lobo Ribeiro, membro da equipe do Programa de Saúde Mental da Mulher, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, “antes de diagnosticar a depressão, é o médico que deve certificar-se de que os sintomas descritos pelo paciente são, de fato, de natureza psíquica”.

A relevância do diagnóstico

Ribeiro explica que, para alcançar esse objetivo, é preciso descartar a presença de algumas doenças que leva à manifestação de sintomas similares, o uso de substâncias passíveis de abuso, além de uma possível simulação para fins legais, entre outros fatores.

O que é ter uma doença mental?

Trata-se de uma condição que leva à limitação das capacidades funcionais. Para o paciente, há uma restrição de ter e sentir bem-estar, e isso prejudica sua performance profissional como um todo e, além disso, afeta suas relações sociais e com a família, pois ele não as consegue amadurecer. O que a pessoa vivencia é uma dificuldade de desfrute da vida em geral.

Por que a mulher é tão vulnerável?

Do ponto de vista biológico, ela está sob os efeitos das oscilações hormonais que ocorrem na menarca, gestação, climatério e menopausa. Mas este não pode ser considerado um fator exclusivo. A herança genética é relevante. Filhos de um dos pais que tenha doença mental terá maior chance de apresentar o problema. Se o pai e a mãe tem depressão, o risco aumenta ainda mais. Dessa forma, o fator hormonal é um dos elementos biológicos, assim como o genético, mas questões ambientais e sociais influenciam o quadro. Mulheres com menor escolaridade estão mais vulneráveis porque têm menos qualidade de vida (o que inclui a alimentação e condições de trabalho fora e em casa), e ainda têm pouco acesso ao tratamento e diagnóstico precoces.

Para elas, é mais fácil pedir ajuda?

Aparentemente, as mulheres admitem o sofrimento com mais facilidade do que os homens. E é enfrentado de uma forma mais dolorida, o que as leva a reconhecer o problema e a aceitar ajuda. Já os homens tendem a resistir mais, têm uma percepção reduzida dos prejuízos que a doença mental traz à própria vida. Esse comportamento, a médio e longo prazo, levam a danos graves que poderiam ter sido evitados caso admitissem, por exemplo, a depressão ou a dependência alcoólica. Some-se a isso o fato de que as mulheres são maioria na procura por auxílio em qualquer especialidade médica. Há uma cultura machista de que a busca por apoio é um tipo de fraqueza inadmissível na ala masculina. Felizmente, isso está mudando.

Quais as causas mais comuns?

São psíquicas e emocionais. Antes de concluir um diagnóstico, porém, o especialista deve descartar a presença de alguma doença física. A anemia tem como manifestações a tristeza, o desânimo, a falta de energia. Esses sinais parecem depressão, mas a origem é a anemia. O hipertiroidismo causará ansiedade, insônia, desconforto físico. O uso de substâncias como medicamento (hidrocortisona, dexametasona) e drogas de abuso (álcool, maconha) também. E ainda pode ser que o mal-estar se relaciona aos contextos pessoal, familiar ou profissional, o que nos leva às causas relativas. Acrescente a essa lista uma possível sugestibilidade do paciente que convive com uma pessoa psicótica (folie a deux – “loucura a dois”, em francês, é uma síndrome psiquiátrica muito rara na qual um sintoma de psicose é transmitido de um indivíduo para outro.), bem como a simulação da doença para obter vantagens legais. Descartadas essas possibilidades, buscaremos as causas. E elas são multifatoriais: genética, ambiental (familiar e trabalho) e até o clima.

Quando é hora de procurar ajuda?

A pessoa experimenta um conjunto de dificuldades psíquicas, emocionais e de relacionamento, mas a conversa com o amigo ou o líder espiritual não alivia o desconforto emocional. A pessoa percebe que tem dificuldade para resolver os problemas no trabalho e para atender às necessidades da família e às de seus relacionamentos. Enfim, a hora certa é toda vez que houver dúvida e dificuldade em vivenciar o bem-estar, bem como quando as tentativas de superação não levaram a uma melhora significativa.

O que esperar do tratamento?

Deve ser multidisciplinar, combinando o uso de medicamentos, psicoterapia, orientação nutricional e educação física. Entretanto, é preciso dizer que a primeira medicação pode ter efeito colateral. Quando o paciente começa a usar a medicação, ficamos atentos à falta de relato de algum efeito colateral, pois cogitamos a possibilidade de ser um fármaco fraudado. A boa notícia é que sabemos como esses efeitos se manifestarão. Geralmente, obedece à seguinte sequência: o paciente tende a piorar inicialmente para, depois, começar a melhorar. Esta é uma característica desse tipo de remédio. Contudo, as pessoas esperam que ele tenha ação semelhante à um analgésico. Mas, na psiquiatria, os fármacos não tem efeito imediato. Será necessária a espera de duas a quatro semanas para que possamos observar uma evolução positiva. Antes, porém, haverá uma piora inicial.

Isso repercute na adesão à terapia?

Não existe aderência plena. As dificuldades começam com indicações equivocadas de profissionais leigos e até de especialistas desatualizados, passam pelas tentativas de tratamento por meio de benzedura, banhos termais, até o receio dos efeitos colaterais – que de fato acontecem -, como o ganho de peso. Uma parte dos fármacos tem esse efeito. Mas o paciente precisa saber que eles podem ser substituídos por outros “menos engordantes”.

A beleza vem antes do bem-estar?

Na verdade, o paciente se vê envolvido em várias questões. Nos casos considerados mais graves, o tratamento deve ser feito em médio e longo prazos. E eles querem receber alta precoce. E há ainda a dificuldade de deslocamento, os pedidos de saída do trabalho. E quando tudo isso pode ser contornado, indicamos também a estratégia de manutenção – mesmo na ausência dos sintomas,o medicamento precisa ser mantido para prevenir recaídas.

Então, as recaídas são comuns?

Sim, nos casos moderados a graves. Nos leves, após o devido tratamento, há restabelecimento e, em geral, não há necessidade de retomá-lo. A maioria recebe o tratamento e segue a vida. Mas ressalto que mesmo pacientes que estão em tratamento e não apresentam sintomas podem ter uma recaída.

E o que é considerado grave?

São os casos em que os cuidados ambulatoriais, o que exclui a internação, não levam a uma melhora. Porém, nas últimas duas décadas as opções medicamentosas aprimoraram sua eficiência. Assim, o uso de fármacos, somados à psicoterapia, trazem resultados mais rápidos e duradouros. Dessa forma, a gravidade se estabelecerá a partir de necessidade de tratamento intensivo. isto é, retornos semanais ao ambulatório ou internação hospitalar. Os casos mais graves são aqueles em que há risco de suicídio, ferimentos autoinduzidos ou quando a pessoa deixa de atender às demandas da vida: cuidados com a higiene pessoal, falta de energia, tristeza intensa, ausências no trabalho, negligência com os filhos, não os atendendo em suas necessidades básicas.

O que leva a esses ferimentos?

Algumas doenças desencadeiam comportamentos em que as mulheres se machucam em locais visíveis, como a mão e o rosto; ou escondidos, como o abdome. Esse sintoma pode ocorrer na maioria dos transtornos mentais, e especialmente nos transtornos da personalidade, destacando-se entre eles, o borderline. Nele, há particular dificuldade de conter impulsos agressivos contra si e os outros.

Dá para prevenir doença mental?

Sim, por meio do que chamamos de prevenção secundária. Há dois tipos de prevenção: a primária, aquela que faz uma avaliação antes do início da doença – uma mamografia para identificar um câncer de mama, por exemplo. E a secundária, na qual não se realizam testes, mas decorre do esclarecimento das pessoas sobre determinada patologia psíquica. Isso inclui os profissionais de todos os níveis, que devem estar prontos para detectar esse tipo de sintoma, em toda e qualquer avaliação. Nesse caso, o que ocorre é uma busca ativa da doença, ainda que o motivo da consulta tenha outro objetivo. A prevenção secundária é uma forma de antecipar um diagnóstico por meio da informação – para o paciente e o médico. Ambos se sentem estimulados a procurar por sinais correspondentes, mesma que a consulta não tenha essa finalidade.

– Fonte – Ler e Saúde

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