Um estudo publicado no final de julho por Shenhav e Randy Buckner, dois neurocientistas do Departamento de Psicologia da Universidade de Harvard, trouxe à tona uma faceta inédita da ansiedade – um sentimento que pode se tornar patológico e gerar doenças como a Síndrome do Pânico, por exemplo. A pesquisa revela que o cérebro humano reage da mesma maneira ao ser confrontado a escolhas, sejam elas positivas ou negativas.
Durante o experimento, os pacientes foram colocados em um aparelho de ressonância magnética e tiveram que optar entre as imagens de vários produtos de valor, como Ipods ou câmeras digitais. Observando o comportamento dos pacientes, os cientistas descobriram que essa escolha gerava um sentimento positivo, mas também ansiedade. Um dos motivos seria o medo de tomar uma má decisão. Esse paradoxo é inédito, como explicou à RFI Marcio Bernik, coordenador do Amban, o Ambulatório de Ansiedade do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
RFI – Por que este estudo é inédito ?
Márcio Bernik – O estudo é inovador porque aborda um paradoxo.Normalmente a ansiedade surge entre uma escolha que sempre tem um valor motivacional negativo. Ou seja, existe uma necessidade de aproximação para obter um ganho e existe um risco com essa aproximação. O exemplo mais simples é um animal procurar comida na floresta, onde pode ter comida, mas também predadores. Antes desse estudo, ansiedade era sempre descrita como tendo um valor motivacional negativo, ou seja, a pessoa se sente mal diante de uma possibilidade.
RFI – Quando a ansiedade se torna patológica ?
M. B – Na verdade quando falamos de ansiedade neste contexto, que são mecanismos de defesa cerebral, você tem três situações emocionais distintas: medo, quando você tem antecipação só de um perigo, mas esse perigo não tem um risco imediato para você de destruição. O comportamento costuma ser de uma fuga simples: você se afasta e se esquiva do perigo. Isso corresponde à vivência de medo no ser humano. Quando existe a proximidade de algo que pode causar sua destruição, a vivência no ser humano é aquela que chamamos de pânico. Nos animais chamamos de reação de fuga e luta.
Ela é caracterizada por uma fuga desorganizada: a pessoa fica confusa, querendo sair do lugar de qualquer maneira. O importante é que cada uma dessas reações cerebrais tenha um substrato cerebral diferente. O substrato do pânico não é o mesmo do medo e não é o mesmo da ansiedade, que é o estado emocional quando o risco é incerto – uma avaliação de que a aproximação daquilo que ele deseja é bom, ou existe um risco. É o conflito : quando existe conflito, você tem ansiedade e não tem fuga, tem imobilidade, incapacidade e demora em decidir o que fazer.
RFI – Ansiedade então é patológica quando gera sintomas?
M. B – Essa ansiedade se torna patológica quando leva a sofrimento excessivo ou prejuízo funcional – a pessoa é incapaz de decidir a ponto de deixar a vida decidir por ela. Outro exemplo é não conseguir sair de casa sem ter muitos sintomas físicos ou sofrimento emocional. Mas no dia a dia, é importante que a pessoa saiba reconhecer que a ansiedade é algo normal, que é natural, que faz parte da sua personalidade e muitas vezes é um preço a pagar para conseguir algo que você considere realmente importante. O importante, então, é o autoconhecimento e fazer escolhas importantes para você, não o que a sociedade diz que é o melhor.