Em condições normais, já lidávamos com crescentes problemas de saúde mental, no país. Com a pandemia, isso se agravou. Mesmo pessoas que nunca apresentaram alguma situação preocupante estão, agora, propensas a passar por momentos de instabilidade emocional. No entanto, são os pacientes com condições preexistentes que mais precisam de atenção especial.
É que, com o distúrbio instalado, cresce a vulnerabilidade para recaídas e para o aumento dos sintomas, e isso se torna um fato preocupante. No entanto, será que há alguma maneira para evitarmos agravos?
Para responder isso, conversamos sobre saúde mental no isolamento social com o Dr. Marcel Nunes, psiquiatra e psicogeriatra do Hospital Santa Mônica, que se referiu a esse momento como a “quarta onda”. Acompanhe o texto e entenda o porquê!
Os impactos do isolamento na saúde mental
Vamos combinar que essa situação de ficar meses dentro de casa mexeu com todo mundo! Uns sentiram mais, outros menos, mas a pandemia nos afetou a todos em algum aspecto.
“Tanto o isolamento quanto a própria pandemia trouxeram um impacto bastante significativo, inclusive, estamos passando por um novo momento da saúde, que é considerado a quarta onda”, relata Dr. Marcel.
O psiquiatra relaciona as ondas com as fases da pandemia. A primeira foi impulsionada pela própria doença e o contágio. A segunda está relacionada às pessoas que tinham algum problema urgente, mas não conseguiam ser atendidas, em razão da demanda provocada pela Covid-19. A terceira é ligada a quem tem doenças crônicas ou de longo tratamento e precisou fazer uma pausa, devido à falta de recursos e insumos.
“A quarta onda está relacionada aos problemas mentais em decorrência do isolamento social e da pandemia. Traumas psíquicos e o desgaste mental começaram a surgir. Isso já é visto como um problema de saúde pública, não só aqui, mas em todo o mundo”, explica Dr. Marcel.
São várias as razões de sermos tão impactados pelo distanciamento. A falta de contato social é uma delas. Desde os tempos das cavernas, estar em grupo é um recurso de sobrevivência: se for preciso lutar, temos mais chance de preservar nossa espécie com a ajuda dos outros. Logo, estar sozinho faz nosso cérebro interpretar isso como ameaça, e neurotransmissores referentes ao estresse são acionados.
No entanto, a explicação vai além da Psicologia Evolutiva. O isolamento nos deixa afastados das situações que, normalmente, trariam bem-estar. Ao mesmo tempo, as notícias negativas causam ansiedade e medo que algo aconteça conosco ou com quem amamos.
É como falam: é uma situação sem precedentes. Por mais que já tenham existido outras pandemias, nunca passamos por uma antes, o que dificulta avaliarmos de forma positiva o desfecho da situação.
Os riscos para pacientes com condições preexistentes
O cenário acaba sendo um gatilho para pacientes com condições preexistentes. “O isolamento pode agravar qualquer problema. Tem tido aumento do abuso de álcool, depressão, ansiedade e piora nos casos de estresse pós-traumático. Pessoas que já estavam conseguindo se estabilizar voltaram a ter dificuldades. Temos visto um aumento no número de internações, mesmo para quem não precisaria disso”, conta o psiquiatra.
Então, se o contexto já é motivo suficiente para pessoas saudáveis desenvolverem quadros de ansiedade e depressão na pandemia, quem já luta contra esses transtornos sente mais dificuldade ainda, já que muitos dos recursos utilizados por terapeutas, para ajudar no tratamento, não podem ser colocados em prática.
Ou seja, atividades físicas, caminhadas no parque, passeios ao cinema e saídas com os amigos, práticas responsáveis por ativar neurotransmissores do bem-estar, ficam impossibilitadas — ou, no mínimo, mais difíceis — de serem executadas.
Isso sem contar que o receio da contaminação coloca todos em estado de alerta, quase que 24 horas. Esse fator se torna um grande propulsor para episódios de ansiedade voltarem com mais força.
Pacientes com TOC, Transtorno Obsessivo-Compulsivo, também têm lidado com sintomas mais intensos, já que, agora, os cuidados meticulosos com a higiene são reais e necessários.
O isolamento, ainda, provoca em muitos uma espécie de luto coletivo. As pessoas estão ressignificando aspectos da vida, e isso traz à tona muitas angústias, dúvidas e medos que estavam adormecidos; mais um contexto para a depressão reaparecer.
Os cuidados necessários para esses pacientes
Agora que a maioria das cidades tem diminuído a restrição relativa ao contato social, Dr. Marcel recomenda retomar o tratamento. “Muitas pessoas precisaram parar porque hospitais e ambulatórios foram fechados. Agora, o ideal é voltar, de forma regular, a fazer o acompanhamento psicológico ou psiquiátrico. Quanto mais cedo isso acontecer, mais fácil evitar uma grande crise”.
Para aqueles que já estão em tratamento, a recomendação é tentar manter o quadro psíquico estabilizado. “Quando fazemos o acompanhamento de perto dos pacientes, conhecemos suas condições e conseguimos avaliar e prever quadros de instabilidade. Por isso a importância de a pessoa continuar a receber o devido auxílio: o monitoramento permitirá a identificação de pioras e, caso seja necessário, mudar a intervenção”, explica o psiquiatra.
Outra ideia é se inserir em atividades relaxantes e prazerosas, dentro do possível. Chamadas por vídeo, com pessoas queridas que moram distante, é uma forma de diminuir a saudade e levantar uma esperança da normalização.
Quem mora com a família, em casa com jardim, também pode improvisar atividades com bola, por exemplo. O exercício ativa hormônios do prazer e contribui com a saúde física. Se couber no orçamento, pedir delivery de comida também tem o poder de propiciar momentos agradáveis, além de ser um bom motivo para uma reunião familiar.
No mais, Dr. Marcel também aconselha que amigos e familiares de pacientes com condições preexistentes fiquem atentos aos sinais de piora. “Acho que muitos já estão acostumados a perceberem alguma recaída, mas, agora com a pandemia, é importante ter mais atenção. E, caso seja necessário, encorajar a pessoa à intervenção ou ao tratamento. Além disso, é legal tentar manter uma rotina saudável, mesmo que dentro de casa”.
O Hospital Santa Mônica tem aceitado internações na quarentena, para tratamentos psiquiátricos e psicológicos, e segue o protocolo de prevenção ao coronavírus recomendado pelas autoridades de saúde. Por isso, pacientes com condições preexistentes podem ser recebidos com segurança.
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