Nos últimos anos, remédios injetáveis como Ozempic, Wegovy e Mounjaro explodiram em popularidade, não apenas como tratamento para diabetes tipo 2 ou obesidade, mas também como atalhos rápidos para o emagrecimento. Celebridades e influenciadores reforçaram a febre nas redes sociais.
Porém, enquanto os quilos somem da balança, especialistas acendem o alerta para efeitos colaterais que vão além do físico — atingindo também a saúde mental.
A psiquiatra do Hospital Santa Mônica, Dra. Carla Mendes, irá comentar o assunto trazendo estudos internacionais realizados e suas conclusões, boa leitura!
O que são Ozempic, Wegovy e Mounjaro?
- Ozempic e Wegovy contêm o mesmo princípio ativo: semaglutida, um agonista do receptor de GLP-1.
A diferença é a dosagem e indicação: enquanto o Ozempic é aprovado para diabetes tipo 2, o Wegovy é autorizado para controle de peso em pessoas com obesidade ou sobrepeso com comorbidades.
- Já o Mounjaro contém tirzepatida, que age sobre dois hormônios: GLP-1 e GIP, intensificando o efeito de saciedade.
Esses medicamentos simulam hormônios intestinais que regulam o apetite, promovem a saciedade precoce, retardam o esvaziamento gástrico e reduzem o consumo de alimentos.
Efeitos colaterais físicos comuns
- Náuseas e vômitos
- Diarreia ou constipação
- Refluxo
- Fadiga e tontura
- Hipoglicemia (em combinação com outros medicamentos para diabetes)
Mas além do corpo, a mente também pode ser afetada, e isso nem sempre é discutido com profundidade nas consultas.
Efeitos emocionais e psicológicos: o que se sabe até agora?
1. Alterações de humor
Usuários relatam apatia, tristeza ou sensação de vazio. Para muitos, o prazer da alimentação está diretamente ligado ao bem-estar emocional, e a perda de apetite intensa pode afetar o humor.
2. Ansiedade e irritabilidade
Mudanças bruscas no metabolismo, além da oscilação de glicose, podem causar nervosismo, insônia e até crises de ansiedade, especialmente em pessoas já vulneráveis emocionalmente.
3. Risco de agravar transtornos alimentares ou depressivos
Pacientes com histórico de anorexia, bulimia ou compulsão alimentar devem ser acompanhados de perto, pois a semaglutida pode mascarar sintomas e dificultar o diagnóstico e o tratamento correto.
Segundo a psiquiatra Dra. Carla Mendes, do Hospital Santa Mônica:
“Muitos pacientes chegam aliviados com o emagrecimento, mas emocionalmente instáveis. A medicação pode servir como gatilho para transtornos antes controlados ou mal diagnosticados.”
O que dizem os estudos científicos?
- Um estudo publicado em 2024 no Nature Medicine “Association of semaglutide with risk of suicidal ideation in a real-world cohort” analisou mais de 240 mil pacientes e não encontrou aumento no risco de ideação suicida em usuários de semaglutida. Na verdade, o risco foi menor comparado a outros tratamentos para obesidade.
- Por outro lado, uma análise recente do banco de dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), denominada “Disproportionality Analysis From World Health Organization Data on Semaglutide, Liraglutide, and Suicidality“ mostrou um aumento desproporcional de relatos de pensamentos suicidas com o uso de semaglutida (Ozempic/Wegovy), especialmente em pacientes que também usavam antidepressivos ou ansiolíticos.
- A FDA dos EUA investigou os relatos e concluiu que, por ora, não há evidência de relação causal clara entre os medicamentos e pensamentos suicidas — mas o monitoramento continua.
- Estudos clínicos com tirzepatida (Mounjaro) são mais recentes, mas até agora não indicaram risco aumentado de depressão ou suicídio. Em casos isolados, pacientes relataram inclusive melhora no humor, possivelmente associada à perda de peso e melhora da autoestima.
O apelo estético e o risco de banalização
A promessa de emagrecer até 15% do peso corporal em poucos meses levou a uma corrida desenfreada às clínicas. Mas o uso fora da indicação médica — especialmente em pessoas jovens ou emocionalmente vulneráveis — pode trazer consequências.
“Não é raro encontrar pacientes que desenvolveram obsessão pelo peso, medo de voltar a comer ou distorções na imagem corporal após o uso contínuo desses medicamentos”, alerta a médica.
Conclusão: acompanhamento emocional é essencial
Medicamentos como Ozempic, Wegovy e Mounjaro são medicações importantes quando bem indicadas, principalmente no contexto da obesidade com riscos à saúde. Mas seu uso estético, sem acompanhamento multidisciplinar, pode trazer riscos invisíveis.
Antes de iniciar o tratamento:
- Avalie seu histórico emocional e alimentar
- Converse com endocrinologistas e psiquiatras
- Priorize um plano que inclua psicoterapia e reeducação alimentar
Emagrecer pode ser uma conquista — mas não à custa da saúde mental.
Fontes científicas
- PMC – Revisão sobre efeitos psiquiátricos dos agonistas GLP-1
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC10960895/ - Nature Medicine (Wang et al., 2024) – Semaglutida e risco de ideação suicida
https://www.nature.com/articles/s41591-023-02672-2 - JAMA Internal Medicine – STEP Trials com Wegovy
https://jamanetwork.com/journals/jamainternalmedicine/fullarticle/2823084 - The Lancet eClinicalMedicine – Risco neuropsiquiátrico de semaglutida
https://www.thelancet.com/journals/eclinm/article/PIIS2589-5370(24)00305-5/fulltext - FDA – Investigação sobre risco suicida em GLP-1
https://www.fda.gov/drugs/drug-safety-and-availability/update-fdas-ongoing-evaluation-reports-suicidal-thoughts-or-actions-patients-taking-certain-type - OMS + JAMA Network – Análise de banco global de farmacovigilância
https://jamanetwork.com/journals/jamanetworkopen/fullarticle/2822453 - Relato de caso – Tirzepatida e saúde mental (psychiatrist.com)
https://www.psychiatrist.com/pcc/mental-health-effects-tirzepatide-report-2-patients/ - Revisão sistemática sobre tirzepatida – Endocrine Practice
https://www.endocrinepractice.org/article/S1530-891X(24)00877-2/fulltext