Cresce de forma acelerada o número de jovens e adultos atendidos em SP por comportamento aditivo ligado às “bets”. Especialistas alertam para sinais de risco e reforçam a importância do tratamento multidisciplinar.
O número de atendimentos relacionados ao uso compulsivo de plataformas de apostas esportivas online — as chamadas bets — triplicou no estado de São Paulo nos últimos dois anos, segundo serviços de saúde e centros de apoio psicológico. O aumento acende um alerta sobre os impactos emocionais, sociais e financeiros causados por esse comportamento aditivo.
Profissionais de saúde mental destacam que o acesso facilitado ao jogo online, disponível 24 horas por dia, tem acelerado quadros de compulsão e agravado crises familiares, especialmente entre jovens.
Saiba mais nesta matéria com Antonio Chaves Filho, psicólogo do Hospital Santa Mônica e boa leitura!
O que está acontecendo em São Paulo
Dados de centros de atendimento público e privado indicam que a procura por apoio para comportamento compulsivo em apostas online cresceu entre 180% e 220% desde 2022.
Serviços especializados relatam aumento expressivo de jovens entre 14 e 25 anos que chegam já com prejuízos sociais importantes, como endividamento, irritabilidade e queda no desempenho escolar ou profissional.
Embora o Brasil ainda não tenha estatísticas oficiais consolidadas para gambling disorder, o padrão segue uma tendência global.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o comportamento de jogo problemático é reconhecido como uma condição de saúde que pode gerar sofrimento significativo e perda de controle.
Por que as “bets” se tornaram tão sedutoras?
Plataformas de apostas online utilizam tecnologias de design persuasivo capazes de estimular permanência e repetição. Entre os fatores que favorecem a compulsão estão:
- Acesso ilimitado: funcionamento 24h em qualquer dispositivo.
- Recompensas imediatas: jogos rápidos com sensação de ganho constante.
- Marketing agressivo: influenciadores, celebridades e clubes esportivos.
- Sensação de controle ilusório: ideia de que conhecimento esportivo aumenta chances de ganho.
Estudos internacionais mostram que quanto mais rápido e mais frequente é o ciclo de aposta, maior o risco de evolução para comportamento compulsivo.
O perfil das pessoas que mais procuram ajuda em SP
Psicólogos e psiquiatras relatam que a maior parte das pessoas atendidas apresenta:
- Sintomas de perda de controle, mesmo após prejuízos significativos.
- Comprometimento acadêmico ou profissional.
- Isolamento, ansiedade e alterações de humor.
- Uso concomitante de álcool ou outras substâncias para lidar com frustração.
- Mentiras recorrentes à família sobre tempo e dinheiro gasto.
Além disso, muitos jovens procuram atendimento apenas após dívidas acumuladas, o que agrava a situação emocional e o desespero familiar.
Impactos na saúde mental
A compulsão por apostas online pode desencadear ou agravar condições como:
- ansiedade generalizada
- depressão
- transtorno por uso de substâncias
- insônia e irritabilidade
- ideias de desesperança relacionadas a perdas financeiras e conflitos familiares
Como explica a OMS, comportamentos de jogo compulsivo envolvem o mesmo circuito de recompensa cerebral associado a outros comportamentos aditivos — o que exige tratamento especializado.
Quando o comportamento vira um problema?
De forma geral, alerta-se para risco quando a pessoa:
- Não consegue reduzir ou parar, mesmo tentando repetidas vezes.
- Gasta tempo excessivo pensando em apostas.
- Aumenta a frequência e os valores das apostas.
- Compromete dinheiro que deveria ser usado para necessidades básicas.
- Esconde o comportamento da família.
- Demonstra irritabilidade quando não pode apostar.
Comportamentos assim podem indicar critérios compatíveis com jogo patológico segundo a Classificação Internacional de Doenças (CID-11).
Fatores dificultadores ao atendimento do transtorno e tratamento
A conotação moral transforma o jogo compulsivo em “falta de caráter” em vez de problema de saúde, o que afasta as pessoas do cuidado.
Estigma e vergonha
Quando o transtorno do jogo é visto como fraqueza moral, o jogador é rotulado como “irresponsável” e “culpado” pelo próprio sofrimento, gerando vergonha intensa e autoestima. Isso leva ao sigilo, à negação do problema e ao adiamento da busca por ajuda especializada.
Barreiras ao tratamento
A moralização alimenta o medo de julgamento por familiares, profissionais e serviços (psiquiatria, assistência social), de modo que muitos evitam ou abandonam o tratamento. Ao invés de ver o tratamento como cuidado de saúde legítimo, o sujeito passa a entendê‑lo como confissão pública de fracasso moral, o que reduz significativamente o acesso.
“Infelizmente, hoje em dia tem muito streamer que faz live no YouTube todos os dias jogando em casas de aposta, e o pior é que muitos deles são patrocinados pelas próprias plataformas. Aí acabam atraindo o público com aquelas gorjetas ou bônus pra quem se cadastrar.
O problema é que gente de todas as idades assiste, entra por causa dessas gorjetas distribuídas durante as lives e, quando o saldo do bônus acaba, a pessoa começa a colocar o próprio dinheiro. É assim que muita gente acaba entrando nesse ciclo” (fala de um paciente que tem Compulsão por Jogos).
Como o Hospital Santa Mônica pode ajudar
O Hospital Santa Mônica oferece atendimento multidisciplinar especializado para pessoas com comportamento compulsivo relacionado a apostas online, focado em:
- Avaliação e diagnóstico por psiquiatras experientes em comportamento aditivo.
- Internação quando há risco à integridade física, emocional ou financeira.
- Psicoterapia estruturada, incluindo Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC).
- Atendimento em grupo e apoio familiar.
- Acompanhamento de condições associadas, como ansiedade, depressão e transtorno por uso de substâncias.
A equipe trabalha com protocolos atualizados e abordagem humanizada, sempre com foco em recuperação e reconstrução das relações familiares.
FAQ – Perguntas e Respostas
- O que são as “bets”?
São plataformas digitais de apostas esportivas ou jogos de azar acessadas por celular ou computador. Permitem apostar 24 horas por dia.
Fonte: https://www.gov.br/fazenda/ - A compulsão por apostas é considerada uma condição de saúde?
Sim. O CID-11 reconhece o jogo patológico como transtorno do comportamento aditivo.
Fonte: https://icd.who.int/ - Por que os jovens são os mais afetados?
Jovens têm maior exposição digital e maior vulnerabilidade ao design persuasivo dessas plataformas. - Existem sinais precoces de alerta?
Sim: irritabilidade, alterações de sono, queda no rendimento escolar, mentiras sobre gastos e pedidos de dinheiro. - A compulsão por apostas pode levar ao uso de substâncias?
Pode. Em alguns casos, ansiedade e frustração levam ao aumento do consumo de álcool ou outras substâncias. - O tratamento funciona?
Sim. Psicoterapia, suporte psiquiátrico e participação familiar ampliam significativamente as chances de estabilização. - É necessário internar?
Apenas em situações graves, quando há risco significativo ou quando os prejuízos emocionais e financeiros estão fora de controle. - O Hospital Santa Mônica atende casos de compulsão por apostas?
Sim. O HSM é referência em psiquiatria e oferece tratamento multidisciplinar para comportamento aditivo e transtornos associados.
A pessoa sempre precisa admitir que tem um problema?
Não. Muitas chegam ao atendimento trazidas pela família. O diagnóstico é clínico, feito por especialistas. - As perdas financeiras fazem parte do diagnóstico?
As perdas não definem o transtorno, mas são consequência frequente que agrava o sofrimento emocional.
FONTES CONSULTADAS
- Organização Mundial da Saúde (OMS) – Classificação Internacional de Doenças (CID-11): https://icd.who.int/
- Ministério da Fazenda – Informações sobre regulamentação de apostas: https://www.gov.br/fazenda/
- Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) – saúde mental e comportamentos aditivos
- Publicações recentes de centros clínicos especializados em jogo patológico
Todos os dados foram verificados até dezembro de 2025.