Estima-se que 4,4 milhões de crianças entre 5 e 12 anos sofram de enxaqueca. E uma pesquisa revelou que esses pequenos pacientes têm 230% (3,3 vezes) mais riscos de serem diagnosticados também com Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Se consideradas crises em mais de 14 dias ao mês, a chamada enxaqueca crônica, o risco aumenta para 720% (8,2 vezes mais). A descoberta tem representado um sinal de alerta para pais e pediatras.
A pesquisa inédita de relação das doenças é do neurologista da infância e adolescência Marco Antônio Arruda, mestre e doutor em Neurologia pela Universidade de São Paulo, membro titular da Academia Brasileira de Neurologia (ABN), da Associação Brasileira de Neurologia e Psiquiatria Infantil (Abnepi) e da Associação Brasileira de Déficit de Atenção.
Com a ajuda de outros pesquisadores, como Marcelo Bigal, professor assistente de Neurologia da Albert Einstein College of Medicine; Renato Arruda, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); e Vincenzo Guidetti, da Universidade de Roma, o neurologista Arruda entrevistou pais de 6.445 crianças e adolescentes de 87 cidades e 18 estados.
Segundo Marco Arruda, a descoberta traz um alerta para dois públicos. “Aos médicos, para que diante de uma criança com enxaqueca, chequem a parte comportamental, principalmente a presença dos sintomas de TDAH. E para que as mães – uma vez que a criança tenha dor de cabeça, desatenção e dificuldades na escola – procurem um especialista, porque pode haver essa comorbidade”.
A descoberta comprova o que números já mostram no País. Pelo menos 912 mil crianças brasileiras de 5 a 12 anos – o equivalente a 3,3% da população infantil – têm TDAH, mas nunca se trataram. A estimativa é que cerca de 625 mil pais e responsáveis não saibam que esses menores estão doentes.
Tanto a enxaqueca quanto o TDAH provocam impactos na vida da criança. “Prejudicam em termos de comportamento, ajuste e desempenhos social e escolar. E a enxaqueca, por si só, muito comumente faz com que a criança tenha sintomas de depressão e ansiedade”, esclarece Arruda.
Ainda não há uma explicação cientificamente comprovada para associar o transtorno de hiperatividade com a enxaqueca, mas uma hipótese é um problema neuroquímico, principalmente relativo a dois neurotransmissores: a dopamina e noradrenalina.
Tratamento
A enxaqueca só pode ser controlada, não curada. Mas, na infância, sabe-se que meninos têm chance maior de a doença ser controlada e nunca mais voltar. Tudo por causa dos hormônios. Mesmo que medicamentos façam efeitos contra crises nas meninas, a doença tende a voltar quando ocorre a menarca – a primeira menstruação.
Independentemente do sexo da criança, os pais devem procurar um médico, que vai diagnosticar se é mesmo uma enxaqueca e vai medicar ou não o paciente. Não há exames para comprovação: apenas avaliação clínica.
O neurologista Marco Antônio Arruda explica que os pais precisam ser colaborativos. “Existe grande preconceito sem base de conhecimento. Os medicamentos para enxaqueca de forma geral não são medicações controladas e praticamente não têm efeitos colaterais. Remédios para déficit de atenção são psicoestimulantes usados há 55 anos e que nós, médicos, temos segurança em receitar a médio e longo prazos”, diz Arruda, para salientar que estimulantes não provocam dependência.
“A criança com TDAH tem risco sete vezes maior de uso e abuso de dependência química, porque o problema é uma falta de breque cerebral. Com os psicoestimulantes, o risco se reduz e fica igual ao da população geral. Ou seja, tratar adequadamente protege a criança contra desfechos muito negativos no futuro”, destaca.
Fonte: A Tribuna