“Navegar é preciso, viver não é preciso”, disse o grande poeta Fernando Pessoa. A vida em família, com suas dores e alegrias profundas, confirma com veemência essa afirmação. Cuidar de alguém é um salto no escuro. É nutrir com carinhos e cuidados a vida de alguém, mas não ter controle sobre o que será dessa pessoa. Infelizmente, a vida tem atalhos e encruzilhadas, que muitas vezes se oferecem sedutoramente, principalmente aos mais jovens. Gostaríamos de estar no controle, e fazê-los evitar esses caminhos tortuosos, mas o livre-arbítrio dado a cada ser humano não nos permite isso.
Isso não exime, porém, nossa responsabilidade de apoiá-lo, de ser o esteio pelo qual ele poderá se recuperar. Sendo assim, no momento em que a família percebe comportamentos diferentes em algum familiar, e suspeita do uso abusivo de álcool e outras drogas, é necessário tomar algumas providências. E aí surge o desafio: como construir confiança e diálogo com o ente querido?
O bom relacionamento entre o dependente químico e seus familiares é fundamental para a sua recuperação, esteja ele fazendo uso abusivo do álcool ou das drogas. A família é um sistema dinâmico em constante transformação, que cumpre sua função social transmitindo valores e tradições culturais. O impacto sobre ela, do uso de drogas de um de seus membros, corresponde às reações que ocorrem com o próprio usuário. Esse impacto pode ser descrito em quatro estágios, pelos quais a família progressivamente passa.
- Negação ou resistência em perceber a situação.
- Tentativa de controle; tentar controlar o comportamento do outro.
- Desorganização da família; as pessoas ficam confusas sem saber o que fazer e acabam se isolando.
- Exaustão emocional; as pessoas podem se sentir sem ânimo para nada e não enxergam solução para a situação.
O desafio é grande, mas nada há que não possa ser remediado. Por isso estamos aqui, para apoiar as famílias com o máximo de informação. Sendo assim, neste post daremos 5 dicas para facilitar a comunicação com o familiar, estabelecer um diálogo e facilitar um possível engajamento em um tratamento.
1. Entenda a doença
Busque informações confiáveis de especialistas sobre o assunto. Bem informado, você terá mais argumentos para ajudar no engajamento da pessoa, seja em um tratamento ambulatorial ou seja em um processo de internação.
Quanto mais informações temos, mais conscientes e esclarecidos ficamos para poder ajudar. Busque informações na Internet (tenha o cuidado de selecionar informações com embasamento científico), leia livros, converse com pessoas que passam pela mesma situação familiar e que estejam em tratamento (frequentando grupos de mútuo ajuda, psicoterapia etc.)
A mudança do uso abusivo para a instalação da dependência química acontece de uma forma sutil, sem que percebamos, por isso é importante ter conhecimentos apropriados.
2. Seja honesto
Entre em contato com seus sentimentos. Em primeiro lugar, seja honesto com você mesmo. Pergunte-se: “como me sinto quando aquela determinada pessoa age comigo daquela forma”?. Em segundo lugar, seja honesto com a pessoa que tem problemas com abuso de álcool e ou outras drogas. Ao dizer o que se sente, você ajuda a pessoa a entender que algo está errado na situação que ela está vivendo.
É muito importante se comunicar, sendo claro, objetivo e honesto. A comunicação eficaz é importante em qualquer contexto e nas famílias ainda mais, pois são pessoas com quem temos um laço afetivo. Aumente o diálogo e foque na comunicação assertiva.
3. Coloque limites
Volte a ter contato com seus princípios e valores, não aceitando situações que passem por cima do que você acredita e respeita. Não tolere comportamentos inadequados, que fazem a pessoa não lidar com as consequências de seus atos. Certos comportamentos e anuências facilitam a perpetuação do abuso da substância.
A medida que a pessoa se dá conta do que está perdendo na sua vida, como: o emprego, a confiança da família, os bens materiais, o tempo vivido e a qualidade de vida, isso facilita o entendimento de que algo na sua vida precisa mudar.
Fique atento a situações como: agressividade excessiva, conflitos constantes, endividamento, mentiras, manipulações, troca de amizades, isolamento, faltas no trabalho ou perda do emprego, perda de interesse nas atividades que antes tinha prazer.
4. Seja firme
Mostre empatia. Isso é importante para que as pessoas consigam entender os sentimentos dos outros. No caso da dependência química, é muito importante entender que o indivíduo precisa de ajuda. Existem famílias que têm uma dinâmica disfuncional (falta de limites claros, inversão de papéis, pouca ou nenhuma demonstração de afeto e carinho, abuso de álcool, drogas ou medicamentos, alienação parental, excesso de críticas e rigidez, conflitos frequentes e etc.). Saiba identificar esses casos e atue para mudar essas dinâmicas.
Por isso, procure manter suas convicções. Não volte atrás em algo que já determinou, pois isso irá mostrar à pessoa que tem problemas com uso de substâncias que você é coerente com o que fala e faz.
5. Frequente grupos de autoajuda
Nesse momento, a família encontra-se confusa e na grande maioria das vezes não consegue discernir o que é melhor. Frequentar grupos de autoajuda (GAA), onde a principal função é a troca de experiências entre as pessoas que passam pela mesma situação, abre espaço para que a família sinta que não está sozinha nesse momento complexo de suas vidas.
Conheça um pouco mais de alguns desse grupos.
- CoDA – Codependentes Anônimos: É um grupo de ajuda e suporte que visa auxiliar e manter relacionamentos adequados e estáveis com os outros e consigo mesmo. São reuniões que ocorrem em local propício para expressar os sentimentos e pensamentos, criando mais confiança em si mesmo e no próximo.
- Alcoólicos Anônimos (Al-Anon). Os Grupos Familiares Al-Anon são uma associação de amigos e parentes de alcoólicos que trocam experiências, auxiliam uns aos outros por meio da esperança, a fim de elucidar as dificuldades e anseios que têm em comum.
- Narcóticos Anônimos. Com representação no Brasil, esse grupo de apoio encontra-se em vários países, visando ajudar parentes e amigos próximos de dependentes químicos. Essas associações baseiam-se em 12 passos e tradições, que visam conscientizar a dependência como doença que precisa ser tratada, não uma questão meramente moral.
- Amor exigente. Trata-se de uma ONG que atende e atua desde 1984, orientando aos membros da família de dependentes químicos e às demais pessoas que apresentam comportamentos inadequados. Por meio de um eficaz programa de ajuda mútua, essa associação desenvolve estratégias para a reestruturação familiar.
- Grupo de Apoio à Dependentes Químicos e Familiares. A Unidade Integrativa do Hospital Santa Mônica, unidade avançada do Hospital, realiza encontros semanais com pacientes e familiares sobre dependência química e saúde mental. Mais informações podem ser obtidas pelo telefone 11 3045-2228.
Esperamos que tenha gostado do texto e que ele possa ajudá-lo a colaborar com a pessoa a quem você tanto ama. Seguindo essas dicas, fica mais fácil compreender e cultivar um bom relacionamento com o dependente químico. Para aprofundar ainda mais seu conhecimento sobre esse assunto tão importante, leia e entenda mais sobre os riscos do uso de drogas Até a próxima!