Crianças e adolescentes com transtorno de identidade de gênero estão mais propensos à automutilação e ao suicídio, de acordo com um novo estudo. Os autores afirmam que essa vulnerabilidade não se dá apenas em função do estigma social. Eles recomendam que as crianças que apresentam transtorno de identidade de gênero recebam acompanhamento especializado constante na prevenção da automutilação e da ideação suicida, assim como de problemas comportamentais e emocionais em geral.
O estudo, liderado por Madison Aitken, foi publicado na edição de junho do Journal of the American Academy of Child and Adolescent Psychiatry. Pesquisadores utilizaram relatórios do Child Behavior Checklist (CBCL), preenchidos pelos pais, para avaliar 572 crianças de três a 12 anos encaminhadas para um serviço especializado em identidade de gênero, de 1976 até 2015.
Essas crianças foram comparadas a três grupos de controle: 425 irmãos das crianças com transtorno de identidade de gênero, 878 crianças atendidas por outras queixas clínicas e 903 crianças que não foram encaminhadas para atendimento clínico.
Como métrica de tendências suicidas os pesquisadores usaram os itens 18 (“automutilação deliberada ou tentativa de suicídio”) e 91 (“menção ao suicídio”) do CBCL. Ambos são classificados em uma escala de 0 a 2, sendo 0 = “não é verdade”, 1 = “parcialmente verdade ou às vezes verdade”, e 2 = “inteiramente verdade ou frequentemente verdade”.
Foi estabelecido um índice global de tendências suicidas por meio da soma destes dois itens. Como métrica de mau relacionamento com os colegas, foram usados os itens 25 (“ausência de interação com outras crianças”), 38 (“alvo de implicâncias recorrentes”) e 48 (“malquisto por outras crianças”) do CBCL.
Para os problemas comportamentais, os pesquisadores somaram todos os itens do CBCL e subtraíram os dois itens relacionados com suicídio.
O estudo mostrou que o grupo encaminhado, em geral, apresentou problemas comportamentais significativamente maiores do que os outros três grupos.
O grupo encaminhado por questões de gênero apresentou problemas comportamentais consideravelmente maiores do que o grupo dos irmãos de crianças com transtorno de identidade de gênero e do que o grupo das crianças que não foram encaminhadas. E, por sua vez, o grupo dos irmãos de crianças com transtorno de identidade de gênero teve mais problemas comportamentais do que o das crianças que não foram encaminhadas (para todos, P < 0,05). Tanto o grupo encaminhado por outras queixas clínicas, quanto o grupo encaminhado por questões de gênero tiveram, em média, pior relacionamento com os colegas do que o grupo dos irmãos de crianças com transtorno de identidade de gênero e o das crianças que não foram encaminhadas (para todos, P < 0,05).
O grupo encaminhado por outras queixas clínicas obteve o maior índice percentual (22,7 por cento) no item 91 (“menção ao suicídio”), seguido pelos grupos encaminhado por questões de gênero (19,1 por cento), dos irmãos de crianças com transtorno de identidade de gênero (5,8 por cento) e das crianças que não foram encaminhadas para atendimento clínico (1,7 por cento).
Um padrão semelhante foi observado em relação ao item 18 (“automutilação deliberada ou tentativa de suicídio”), que registrou os seguintes índices: 18,6, 6,5, 2,2 e 0,2 por cento, respectivamente.